quinta-feira, 27 de março de 2014

REVISTA NUTRIR +: ATUALIDADES SOBRE MICROBIOTA INTESTINAL










No entanto a microbiota humana sofre modificações e agressões ao longo da vida, em função de hábitos dietéticos não equilibrados, consumo de bebidas e alimentos com aditivos químicos, ingestão de álcool em excesso, estresse físico e emocional, sedentarismo, uso de antibióticos e outros medicamentos entre outros fatores. A resultante possível é a disbiose, ou seja, a presença de microbiota com composição de microrganismos distinta da adequada para o gênero e faixa etária do individuo. Hoje, novas ferramentas sofisticadas de biologia molecular permitem mapear com muita precisão a microbiota normal e associar estados de doença com disbiose, particularmente intestinal.


Nos extremos de idade reduzem-se as defesas orgânicas, assim crianças e idosos adquirem mais facilmente infecções comunitárias e comuns. Os idosos têm sua microbiota intestinal modificada em relação ao adulto, com predomínio intenso dos filos firmicutes e actinobactérias. Por terem alimentação pouco equilibrada, com pouca quantidade de fibras, e usarem polimedicação os idosos podem ter predomínio de enterobactérias patogênicas em sua microbiota. De outro lado, são susceptíveis a infecções virais por Influenza que requerem hospitalização por sua morbidade.


A microbiota intestinal exerce influência considerável sobre uma série de reações bioquímicas do hospedeiro, cada vez mais estudos clínicos e experimentais têm evidenciado que a interação microbiota - hospedeiro pode influenciar favoravelmente a saúde humana de diversas maneiras. 


As principais funções positivas atribuídas à comunidade bacteriana do trato gastrintestinal destacadas por Brandt e colaboradores (2006) são:


1. Antimicrobiana: através da competição por sítios de adesão e/ou nutrientes, produção de compostos antimicrobianos que inibem multiplicação e adesão de patógenos;


2. Imunomoduladora: através do desenvolvimento de tolerância imunológica e estímulo para o sistema imune;


3. Metabólica/nutricional: através da digestão dos carboidratos, produção de ácidos graxos de cadeia curta (AGCC), nutrição do colonócito, conversão do colesterol em coprastanol; conversão de bilirrubina em urobilina; inativação da tripsina; síntese de vitamina K.


Dessa forma podemos evidenciar a importância de microbiota intestinal saudável, e da manutenção do seu equilíbrio para promoção da saúde de um indivíduo, já que bactérias benéficas e protetoras da mucosa intestinal convivem com outras patogênicas que podem causar dano à célula intestinal. Portanto é recomendado garantir um equilíbrio, pois caso contrário a disbiose intestinal pode vir a causar diversas patologias, inclusive o câncer. 


Parece cada vez mais claro que os microrganismos que habitam nosso intestino têm um enorme impacto sobre a saúde e doença dos seres humanos. Desvendar a complexidade e o papel da composição da microbiota intestinal e suas funções potenciais na saúde e na doença tornaram-se recentemente um campo fascinante e de rápida expansão de pesquisa. A ideia de que a diversidade genética elevada da microbiota intestinal está tipicamente associada ao estado de saúde do hospedeiro claramente emergiu nos últimos anos. 


Descobertas recentes têm mostrado que as pessoas obesas hospedam menos tipo de micróbios em seu intestino do que magras e têm uma riqueza significativamente diferente de taxa especifica e genes funcionais. A microbiota intestinal parece contribuir na extração, estoque e gasto de energia obtido a partir de nutrientes da dieta. 


Um estudo de coorte relatou que 40% dos genes microbianos presentes em cada ser humano individualmente são compartilhados com cerca da metade dos demais seres humanos, mostrando evidências de que há um “núcleo de microbioma”. Outra curiosidade é que, se os microrganismos que compõem a microbiota fossem agrupados e pesados sobre uma balança, seria obtida massa de aproximadamente 1,5 Kg. 


Outras evidências relatam o efeito protetor ao sistema cardiovascular, quando a microbiota intestinal está equilibrada e bem alimentada, algumas bactérias liberam propionato, substância que é enviada ao fígado, onde reduz a produção de colesterol. Com menos gordura circulante, diminui o risco de placas obstruírem as artérias. Além disso, novas evidências mostram que fontes alimentares de fosfatidilcolina e carnitina estão envolvidas no metabolismos de trimetilamina-N-óxido (TMAO), que aumenta o acúmulo de colesterol nos macrófagos, de células espumosas na parede das artérias e aterosclerose. 

Mais recente, um estudo mostrou que a microbiota intestinal de pacientes HIV positivos com doença avançada eram muito diferentes de pessoas não infectadas. Mais pesquisas são necessárias, para verificar a possibilidade de desenvolver uma estratégia que envolva a restauração da flora intestinal para desacelerar o avanço do HIV. 


Outros estudos mostram que uma microbiota intestinal em harmonia evita que bactérias com potencial maligno prevaleçam e barra o ataque de micróbios externos. Além disso, modula o sistema imune, participando da ativação ou desativação de processos inflamatórios. 


Assim conhecemos importantes associações entre certas doenças e a modificação da microbiota intestinal como acontece em doenças inflamatórias do intestino, na síndrome do intestino irritável, em obesidade e diabetes. Ou como, por exemplo, em determinados pacientes, com diarreia crônica, resistente ao tratamento convencional, praticamos o transplante fecal, introduzindo microrganismos provenientes de material fecal de doadores saudáveis com bons resultados clínicos no controle da diarreia. 


Nesse contexto manter um equilíbrio apropriado da microbiota intestinal é de suma importância para o adequado funcionamento fisiológico do individuo, com reflexo direto na promoção da saúde e prevenção de doenças. Sendo assim compete ao profissional nutricionista assegurar isso por meio de uma dieta individualizada com a inclusão de probióticos, prebióticos e simbióticos, de forma criteriosa avaliando sempre o objetivo a ser alcançado a fim de contribuir de forma eficiente para o equilíbrio da microbiota intestinal. 


À medida que vamos estabelecendo as alterações da microbiota em diferentes tipos de doenças, seremos capazes de, num futuro não longínquo, de regularizar e reequilibrar a microbiota com o uso de probióticos específicos. Hoje já começamos a modificar a microbiota de forma empírica.

A manutenção da microbiota saudável: os probióticos

O termo probiótico foi introduzido primeiramente em 1953, por Kollath, sendo definido como fatores microbio- lógicos que estimulam o crescimento de outros microrganismos. Somente em 1989 que Rou Fuller determinou a definição atual de probiótico: “Microrganismos vivos que, quando administrados em quantidades adequadas conferem benefícios à saúde do hospedeiro.”

O uso de probióticos

Os probióticos vêm sendo usados cada vez mais no tratamento de algumas condições médicas como: alergias (dermatites atópicas e rinites alérgicas), vaginoses bacterianas, infecções do trato urinário, prevenção de cáries, infecções respiratórias e no tratamento de inúmeros acometimentos gastrintestinais.

Os mecanismos de ação desses mi- crorganismos ainda não foram inteiramente esclarecidos, mas podemos citar seguramente os seguintes benefícios do uso de probióticos:

• Modulação da imunidade gastrintesti- nal alternando o perfil das citocinas in- flamatórias e reduzindo as cascatas pró- -inflamatórias ou induzindo mecanismos regulatórios diferentemente para cada linhagem bacteriana;

• Produção de vitaminas;

• Competição por sítios e nutrientes;

• Deslocamento de bactérias produtoras de gás, degradadoras de sais biliares e sua possível inibição da aderência de es- pécies patogênicas;

• Alteração da flora bacteriana devido à acidificação do cólon pela fermentação de nutrientes;

• Reforço da função da barreira epitelial;

• Redução da hipersensibilidade visceral, tráfico aferente espinhal e resposta ao estresse.

Para serem considerados probióticos, certos critérios devem ser atendidos. A linhagem bacteriana do produto deve ser totalmente identificada e segura para ingestão, aderindo ao lúmen e à mucosa colonizando o intestino durante o período de administração. Deve promover benefícios à saúde, possuir formulação estável quando armazenado e, ainda, o número de colônias bacterianas e sua viabilidade devem ser confiáveis e devem sobreviver ao ambiente ácido e a bile do trato gastrintestinal superior antes de atingirem o intestino delgado e o cólon.

Segurança na administração de probióticos

As preocupações relacionadas ao uso de probióticos, em algumas patolo- gias, cresceram nos últimos anos. Septi- cemia é a maior complicação já relatada sobre administração de probióticos. A endocardite em adultos, devido à infecção por Lactobacillus , é rara, mas já fora relatada. Existem vários relatórios sobre bacteremia em adultos e crianças depois da administração de probióticos. Outros inúmeros casos de fungemia causados por Saccharomyces boulardi já foram reportados na literatura, incluindo dois casos de infecção de pacientes que não estavam tomando probióticos e foram contaminados por indivíduos que estavam sendo suplementados. Apenas um único caso de óbito por administração de probióticos foi relatado até agora.

Atualidades sobre o uso dos probióticos

Efeitos relacionados à Imunidade específica:


A bibliografia científica demonstrou de forma maciça que os probióticos possuem efeito imunoestimulante em animais e no homem, apesar de ainda não estarem esclarecidos todos os mecanismos pelos quais esse efeito se desenvolve.

Parte desse efeito está relacionado à capacidade de determinados microrganismos interagirem com as placas de Peyer e as células epiteliais intestinais, estimulando linfócitos B produtores de IgA e a migração de células T do intestino. Também tem sido demonstrado que os probióticos favorecem a atividade fagocítica inespecífica dos macrófagos alveolares, sugerindo uma ação sistêmica por secreção de mediadores que estimulariam o sistema imune.

Estudos mais recentes comprovaram, no entanto, que a síntese de citocinas pela mucosa intestinal dependia da cepa de Lactobacillus utilizada, salientando a necessidade de realizar uma cuidadosa seleção das cepas candidatas a probiótico. L. casei apresentou efeito imunomodulador extremamente evidente assim como o Lactobacillus acidophilus . Este lactobacilo induz resposta celular tipo 1, aumentando a produção in vitro de IL-12 por células peritoniais e de IFN-γ por células esplênicas. Sua administração protege contra patógenos intestinais pela indução do aumento da capacidade fagocítica dos macrófagos peritoniais e da atividade das enzimas envolvidas na fagocitose, da atividade das células as- sassinas ( natural killer ), da produção de fator citotóxico pelas células de Kupfer e macrófagos peritoniais, e da secreção de IgA no lúmen intestinal.

Novos trabalhos comprovaram que a administração de Bifidobacterium bifidum estimula o sistema imune humoral provocando aumento da produção de IgA antirrotavírus e de IgG antivírus da Influenza.

Probióticos em desordens gastrintestinais (GI)

Diarreia Associada à Administração de Antibióticos (DAA)

Os probióticos diminuem significantemente a incidência de DAA, sendo os efeitos similares independentemente das cepas utilizadas e da duração do tratamento. As cepas mais utilizadas levando em referência os estudos realizados foram a levedura Saccharomyces boulardi , e bactérias ácido lácticas (LABs) administradas em doses de 107 a 1011, durante 5-49 dias, normalmente paralela a duração da antibioticoterapia. 

Diarreia infecciosa 

A diarreia infecciosa em crianças e adultos pode ter seu período encurtado pelo uso de probióticos. Em revisão elaborada recentemente, analisaram-se 23 estudos incluindo quase 2000 pacientes, dos quais 352 eram adultos; foi concluído que probióticos reduzem o risco da diarreia persistente quando comparado ao grupo que não utilizou probióticos. 

Síndrome do Intestino Irritável (SII)

Um estudo realizado utilizando uma composição ( Lactobacillus acidophilus, L a c t o b a cilu s c a s ei e Bifid o b a c t e riu m sp .) determinou uma melhora de até 80% nos desconfortos da SII após 12 se- manas de administração. O teste foi realizado com 68 pacientes. 

Foi demonstrada grande eficácia da Bifidobacterium bifidum na redução dos sintomas relacionados à SII em estudos realizados. Tanto sintomas sistêmicos como individuais relacionados à SII (dor abdominal, inchaço, evacuação incom- pleta, gases e excesso de esforço para evacuar) apresentaram melhora signifi- cante sem a evidência do aumento de eventos adversos. 


Obstipação intestinal infantil

Já fora demonstrado que linhagens de Bifidobacteria bifidum e Lactobacillus casei aumentam a frequência da evacuação e amolecem as fezes em pacientes com constipação e síndrome do intestino irritável (SII).

Um estudo recente demonstrou aumento da frequência na evacuação e diminuição da dor abdominal em crianças constipadas usando linhagens de Lactobacillus acidophilus .

Em 2007, estudo piloto realizado em Amsterdam demonstrou que a administração de uma formulação contendo diferentes linhagens de Bifidobactérias e lactobacilos, resultou em diminuição do desconforto abdominal, aumento da motilidade intestinal e diminuição dos episódios de incontinência em crianças constipadas sem significantes alterações na consistência fecal.

Prevenção do câncer de cólon.

A consequente diminuição do crescimento de bactérias patogênicas determina a modulação de enzimas bacterianas como a beta-glucoronidase que pode ser convertida em substância pró-carcinogênica. 

O composto de Lactobacillus helveticus, Bifidobacteria lactis, lactobacillus acidophilus demonstrou eficácia da diminuição de células de câncer de cólon (HT- 29) mantidas em cultura in-vitro, cerca de 10 – 50% na diminuição de células totais.

Outra cepa relacionada à diminuição de células tumorais em ensaios in-vitro seria a Bifidobacterium longum demonstrando supressão tumoral a partir de 40 dias de administração.

Probióticos na terceira idade.

A obstipação intestinal é extremamente comum durante a terceira idade. A composição bacteriana presente nas fezes sofre alteração com a idade sendo evidenciada pela visível diminuição de Bifidobacteria. O motivo pelo qual a redução dessas bactérias está associada à constipação ainda não foi totalmente esclarecido. O que se sabe é que mudanças na microbiota intestinal pode acarretar em diminuição da motilidade intestinal e que os ácidos graxos de cadeia curta produzidas principalmente pelas Bifidobactérias assumem papel importante na velocidade do trânsito intestinal.

Outras condições

Foram constatados efeitos benéficos da administração de probióticos em outros acometimentos do trato gastrintestinais como intolerância à lactose , H. pylori , colites, prevenção e tratamento de diverticulites.

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